Não é por mal mas sei o mal que me faz.
Sentada na calçada da rua, onde as pedras frias me fazem
sentir alguma coisa, perco-me em pensamentos.
Ouço as batidas frenéticas do coração que parecem quer
escapar-se por entre os tecidos finos da roupa. Ouço o coração bater mas ainda
mais alto o medo a vencer.
Não é ao acaso que por acaso nem todos conseguem chegar a
mim. A porta do meu coração é feita de vidro mas as muralhas em torno dele são
feitas de betão.
Não é por mal que eu demore um pouco mais de tempo a dar um
pouco mais de mim. Não é por mal que muitas vezes evito caminhos de loucuras ou
fecho-me para aventuras.
Coração feito de papelão quando rasgado e mal tratado, palpita
descontrolado ao chegar alguém à sua vida.
Obrigação do inconsciente de travar qualquer entrada que não
seja para ficar.
Tenho medo de despedidas, de abandonos, de distâncias e
tenho medo sobretudo da saudade.
Nas veias que me percorrem o corpo, corre a saudade a uma
velocidade veloz, como se depressa eu tivesse que a sentir para saber que lenta
seria a demora e a espera de voltar a ter.
Tenho medo da instabilidade, de saber que me movo em areias
movediças. Tenho medo de correr atrás de quem um dia já partiu de malas aviadas
e de ideias feitas. Tenho medo de um dia eu olhar e já nada cá estar.
Não tenho medo do amor porque ele é o melhor amigo do
coração, o que preenche o vazio, aquece a alma, destrói as muralhas construídas.
Tenho medo, por ele ser também o maior inimigo do coração, aquele que um dia
quando acaba, transforma a luz em escuridão.
A verdade é que tenho medo. Tenho medo de me entregar por
inteiro e receber partes. Todos incompletos não me fazem sentir de todo
completa.
Mas tenho ainda mais medo de um dia me vir a arrepender.
Se um dia me vires a dizer não ao momento, dá-me um sim como
um estalo para a realidade.
Se algum dia quiser escapar uma batida, obriga-me a tocar. Se
algum dia quiser deixar a dança da vida, toca-me a música que me faz não querer
parar.
Se algum dia me vires fugir, agarra-me com força e não me
soltes.
Não é por mal, é por medo.